Não é segredo que no Brasil vigora uma espécie de culto às
soluções fáceis e engenhosas. "Não conseguiu ingressos para um show nem
passou no exame para motorista?
Não se preocupe; você precisa apenas encontrar um
jeitinho", disse o diário inglês Financial Times, num artigo publicado no
dia 15 de janeiro sobre a economia brasileira.
O artigo - que se chama "O jeitinho monetário
brasileiro" - explica mas não traduz o hábito nacional de se apoiar numa
criatividade que chega a resvalar na ilegalidade para resolver desde os
problemas mais prosaicos do dia a dia até as questões mais delicadas de
política monetária.
Cita como exemplo o pedido feito pelo ministro da Fazenda,
Guido Mantega, ao prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, para que não
aumentasse já as passagens de ônibus para que a decisão não tivesse impacto
sobre as taxas de inflação.
É claro que as autoridades reagiram. Haddad disse que o
pedido de Mantega não significa jeitinho, mas gestão. A questão é que,
incomodando ou não, é impossível deixar de dar razão ao Financial Times.
E os exemplos de jeitinho que o jornal citou são
esclarecedores, sem dúvida. Mas estão longe de representar uma relação
abrangente desse hábito que, convenhamos, já passou da hora de ser eliminado da
vida brasileira.
O Brasil parece ter a mania de produzir leis apenas pelo
prazer de vê-las burladas. Um princípio universal transformado em lei diz, por
exemplo, que o orçamento de um determinado exercício tem que ser aprovado no
ano anterior.
Acontece, porém, que até agora o Congresso Nacional não se
dignou a aprovar a relação de receitas e despesas públicas previstas para o ano
de 2013. E, para não cometer uma ilegalidade, Brasília deu um jeitinho.
E baixou uma medida provisória que autoriza que os gastos
prossigam até a chegada de uma lei que será aprovada Deus sabe quando. Para
tentar aquecer a economia, o governo recorre com frequência ao jeitinho da
renúncia fiscal a determinados setores em lugar de abrir uma discussão séria e
profunda em torno de uma alteração para valer na ordem tributária.
E assim, de jeitinho em jeitinho, os problemas vão sendo
empurrados com a barriga até o dia que for possível.
Visto pelo ângulo da necessidade de mudança de rumos, até
que o artigo do Financial Times pode produzir resultados positivos. Mesmo
porque, na medida em que o hábito começa a ser percebido e apontado como um
problema por observadores internacionais influentes, a possibilidade de se
encontrar uma solução aumenta.
O Brasil precisa deixar de recorrer à meia-sola para
resolver os problemas de sua economia. Reformas consistentes e profundas são
mais do que necessárias para que o jeitinho deixe de ser a ferramenta principal
e passe a ser apenas - e em casos absolutamente secundários - um traço do bom
humor brasileiro.
Ricardo Galuppo, publisher do Brasil Econômico
Nenhum comentário:
Postar um comentário