O Brasil já tem a maior malha de rodovias pedagiadas do
mundo. Quando concluir a licitação dos 7.500 quilômetros (km) previstos no
pacote de concessão, lançado semana passada pelo governo federal, terá 22.973
km de estradas nas mãos da iniciativa privada - quase o dobro da segunda
colocada, que é a Alemanha, com 12.788 km. Nos Estados Unidos, que detêm a
maior malha rodoviária do mundo, a quantidade de rodovias com pedágios é de
8.430 km.
Apesar da liderança no ranking, o Brasil ainda deixa muito a
desejar no quesito qualidade. Da malha total do País, apenas 12% é pavimentada.
Boa parte, no entanto, em condições delicadas, conforme a última pesquisa da
Confederação Nacional do Transporte (CNT). No ano passado, a associação avaliou
92.747 km de rodovias asfaltadas e detectou que mais da metade estava em
condição regular, ruim ou péssima.
Com a crise no Departamento Nacional de Infraestrutura de
Transportes (Dnit), deflagrada no ano passado e que paralisou quase todas as
licitações para manutenção das estradas no País inteiro, a tendência é que os
números piorem ainda mais este ano. "Estamos muito mal. Não temos
estradas, ferrovias e hidrovias", lamenta o presidente da Associação
Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR), Moacyr Servilha Duarte.
Na avaliação dele, o pacote do governo federal é
emergencial, para melhorar uma infraestrutura já existente. Em alguns países,
destaca o executivo, toda a malha rodoviária é pavimentada. Nos Estados Unidos,
67% das rodovias são asfaltadas. Na Índia, a malha pavimentada é equivalente a
toda a malha brasileira, de 1,7 milhão de km.
O consultor Geraldo Vianna, diretor da CNT e ex-presidente
da NTC&Logística, compartilha da mesma opinião de Duarte. Segundo ele,
embora seja a sexta economia do mundo e tenha a maior malha pedagiada, o País
ocupa a 20ª posição no ranking malha rodoviária ponderada pela extensão
territorial e população. "Dificilmente conseguiremos consertar em poucos
anos um abandono de três décadas. Neste momento, precisamos ter calma e
objetivos claros para, talvez, conseguir corrigir em 15 anos o que estragamos
em 30."
Para ele, mais importante do que os R$ 133 bilhões (ou R$ 80
bilhões nos primeiros cinco anos) do pacote é a mudança institucional e
organizacional da área de transportes e logística. "O valor em si não
representa muita coisa, já que está distante das necessidades do País e bem
abaixo dos investimentos de nossos concorrentes China e Índia."
‘Ordem inversa’. Na opinião do professor da Fundação Dom
Cabral, Paulo Resende, para aumentar o volume de estradas pavimentadas e
reduzir a desigualdade no Brasil, o governo terá de fazer uma discussão muito
mais profunda do que a atual. Os projetos atuais são decorrentes de uma demanda
provocada pelo desenvolvimento regional, tem viabilidade econômica. "O
resto tem lógica inversa: o projeto é que vai trazer o desenvolvimento regional
para uma determinada região e, a partir daí, trazer o tráfego de veículo. Quem
sabe um dia poderia ser concedida para a iniciativa privada."
Hoje, completa o professor, a demanda está concentrada em
cerca de 50 mil km de estrada, que respondem por 80% da movimentação de carga
do País. Um exemplo de Resende é a cidade de Juína, um município do Mato Grosso
que fica na divisa com Rondônia. A carga agrícola produzida no local poderia
ser levada para Porto Velho, a cerca de 300 km, e seguir via hidrovia. Mas a
ligação entre as duas cidades é intransitável. "Toda produção tem de
percorrer 3.150 km até o Porto de Paranaguá, no Paraná, para ser exportada.
"O governo tem de selecionar corredores com potencial e trabalhar em cima.
Isso cria um circulo virtuoso de longo prazo."
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